Por Amauri Nolasco
Sanches Junior
Sempre achamos que temos o
direito de inventar termos para esconder traumas e frustrações de si para amenizar
aquilo que só incomoda você mesmo. O que incomoda você mesmo? O fato de não ser
o que você espera que seja que você deveria ser, que de fato, você não é e não
vai mudar o fato se chamando de pessoa com deficiência ao invés de deficiente.
O fato que você adquirir a sua deficiência, ou mais ainda, nascer com a
deficiência, não muda o fato de você ser um deficiente e ponto. Isso é
acometido porque as pessoas são tão acomodadas que não estudam as etimologias
das palavras, sua origem e o porquê é usado tais palavras. Por outro lado,
muitas pessoas ficam preocupadas com termos que esquecem das importantes
medidas de inclusão, medidas esta não respeitadas ainda na nossa nação e
deveriam ser muito mais priorizadas.
A grosso modo, vamos pegar termos
que nós (pessoas normais e que não temos traumas nenhum), temos que escrever
para não irritar o “segmento”, como se fossemos unidos assim. Quando escrevemos
“pessoas com deficiência”, para substituir “deficiente”, não basta achar que
isso vai tirar o estereotipo da deficiência além da pessoa. Bom, se pegarmos o
termo “pessoa” vamos ver que etimologicamente, pessoa é um termo que foi
construído do termo latim “persona” que eram mascaras romanas que eram trocadas
conforme o personagem encenado (na maioria, eram apenas 3 atores e homens). Desse
termo, além de pessoa, foi construído personagem e personalidade, ou seja,
personagem é aquilo que se encena ou se lê num livro, que faz o enredo de uma
história. Existe o personagem histórico (que existiu verdadeiramente) e o
personagem de ficção (que não existiu de verdade). Personalidade, é o que você
é realmente, é o que somos e construirmos ao longo da nossa história social.
Então, pessoa tem dois lados no escopo social: personagem enquanto um ser que
está inserido na história humana, assim, um ser que existe e é atuante (mesmo
que nós não fomos inseridos no livro de história); e ao mesmo tempo, temos
nossa personalidade enquanto ser individual e que construiu toda uma história
dentro da sociedade. Ora, se o “inteligentinho” com deficiência acha que isso
vai mudar o fato das pessoas se conscientizar pela inclusão, vai se frustrar
muito com isso, porque vão continuar sentando no banco preferencial, vão sempre
achar que tem direito de parar na vaga preferencial, entre outras coisas.
Continuando, vamos analisar o
termo “deficiência”, onde há certas confusões. Deficiência vem do latim
“deficiens”, esse termo veio do verbo “deficiere” que quer dizer “desertar,
revoltar-se, falhar”, de “DE” (fora) com “FACERE” (fazer, realizar). A grosso
modo é um movimento que NÃO realiza, porque o “DE” nesse caso é um termo de
negação e nesse caso específico, ele está negando a realização de uma função. Mas
da mesma família veio também “deficiente” que é um ser falho, um ser que não
tem as faculdades de suas funções normais daquilo que se padronizou como o que
seria uma função normal. Não estou dizendo que é certo, mas estou dizendo que
tem a mesma função etimológica. Portanto, tanto deficiente como pessoa com
deficiência, são personalidades que não tem suas funções normalizadas, falham
em suas funções. Mas isso não quer dizer, que fique bem claro, que não somos
seres humanos em nossa totalidade humana entre corpo e alma. Eu só demostrei
que é a mesmíssima coisa, que temos que assumir as nossas falhas e adaptarmos
da melhor maneira possível a vida.
Mas também, pessoa com
deficiência tem uma estética muito mais universalista, porque separa o sujeito
do predicado, então, você consegue só complementar o predicado. Como: pessoa
com deficiência física, pessoa com deficiência mental, pessoa com deficiência
sensorial e por aí vai. Só que é muito chato você ficar se policiando para
escrever pessoa com deficiência ao invés de deficiente – que é muito melhor
esteticamente – porque os “politicamente corretos” assim querem que nós
façamos, que na essência, quer dizer a mesma coisa. Um ser que é um personagem
histórico e é uma personalidade social, que na sua totalidade, é uma pessoa e
vive e é tudo que uma sociedade faz de qualquer pessoa. Não se pensa e não pode
se pensar, que só porque ele é falho em algumas funções, que ele não tem
desejos, não tem sentimentos, não tem preferência, não tem sua própria opinião
(é uma falácia que o deficiente não tem opinião, ele tem, mas é bunda mole
muitas vezes), não tem beleza e qualidade, tem até pessoas, que acham que não
temos diploma.
Tudo que escrevi – que não foi
pouco – foi para demonstrar que para se formar um termo, tem que se estudar a
forma estética, tem que estudar a linguística, tem que se estudar até a
etimologia de uma palavra. Não basta achar que vai criar linguagens e sintaxes
novas, uma sintaxe nova é muito difícil para ser feita e refeita. Como por
exemplo, você colocar a preposição “COM” no meio de um termo desses, que por
bizarrice, dará a colocação muito mais destacada da deficiência do que se somos
chamados de deficientes. Pessoas são personalidades, deficiências são falhas,
logo, personalidades com falhas. Entendeu agora? Entendeu como é muito mais
humano chamar uma pessoa de deficiente como outros países fazem? Conseguiram enxergar
que as pessoas não querem proteções conceptuais furadas?
Quando chamamos um cadeirante de
cadeirante – aqui não interessa quem inventou o termo – nós já especificamos
que são pessoas que necessitam de cadeira de rodas. Agora, quando começamos a
inventar muito, os termos se perdem e começamos a errar a sintaxe, a
terminologia, a estética e a etimologia. Ao invés de dizemos cadeirante, agora,
inventaram um tal de “pessoa com cadeira”, para dizerem que são contra o termo “cadeirante”.
Bom, você diz assim: “existem necessidade de se construir rampas para os
cadeirantes”, ótimo, você estará especificando uma ala dos deficientes que precisam
de uma rampa para subir. Ou eu digo que sou um cadeirante, que me dará um certo
destaque a minha deficiência especifica que precisa de uma cadeira de rodas. Tanto
pessoa, quanto cadeira de rodas, já estará contido no cadeirante e não pode ser
separado por ficar esteticamente, difícil de pronunciar e num tato esquisito. Porque
deixa um vácuo, digamos, muito estranho, como pessoa com cadeira. Podemos perguntar:
que cadeira? Pois deficiência tem uma característica particular, mas cadeira é
muito universal e não é especifico. Quem incentiva esse tipo de mudança, porque
deficiente não faz esse tipo de coisa sozinho porque não se preocupa com nada,
na maioria das vezes, ou é péssimo em português ou simplesmente, tem sérios problemas
neurológicos e eu tenho medo dessas pessoas.
Mas voltando a pergunta “que cadeira?
”, podemos afirmar que não existe nada que me leve a pensar que a cadeira é
algo especifico como cadeira de rodas. Não há harmonia estética no termo. Você pode
escrever pessoa com deficiência muito facilmente, mas você nunca poderá escrever
pessoa com cadeira sem ter uma desarmonia estética que por um lado, não existe
uma simplificação do termo, não existe uma complementação e outra coisa, haja
saco você ficar escrevendo “pessoa com cadeira de rodas”. Agora, há sim
prioridade como acessibilidade, como a adaptação de transporte, existe também,
que a leis sejam cumpridas. Eu sou cadeirante deficiente, isso não resta dúvida
nenhuma.
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