sábado, 14 de abril de 2018

As pessoas com deficiência e os vídeos “bonitinhos”



Descrição: um homem com deficiência recebendo comida na boca por um funcionário da rede Giraffas 


Estava aqui escrevendo meu livro e dado momento, entrei no Facebook e me dei conta de uma Live de um companheiro de segmento das pessoas com deficiência, fez por causa de uma matéria do site Extra, teria destacado. Até pensei que fosse com ele a questão e resolvi ver o vídeo – que foi apagado, se não tivesse visto iria ter ficado no limbo – e escutando esse meu amigo falar, eu vi que não se tratava dele, propriamente, mas de um caso que aconteceu no sábado dia 7. Onde um funcionário do restaurante Giraffas, de um shopping de Salvador (BA), ajudou um homem com deficiência a comer a sua comida e foi filmado pela mulher que iria buscar a comida para o rapaz. A mulher, que segundo o site Extra, tem o nome Laurinha Victória, além de ter filmado, disse ao rapaz:
 “Essa é a verdadeira caridade, que coisa linda.  Que gesto lindo você está tendo .. Deus lhe abençoe. ”

Não quero ter nenhum, o que chamamos na filosofia, juízo de valor da Laurinha. Porque a mulher, talvez, estava fazendo o que todos fazem, enxergam as pessoas com deficiência como coitados, como pessoas que precisam ser carregadas no colinho e cantar cantigas de ninar para elas. Mas, quero explicar a Laurinha e aos demais que acham esse ato de caridade o que seria caridade.

Caridade vem do latim “caritate”, que pode ser: amor a Deus, amor ao próximo, a benevolência, ter bom coração, ter compaixão, ter beneficência ou ESMOLA (guardem esse significado no rodapé).  Deriva do termo também em latim, “Caritas”, que tem o significado de afeto ou amor, que tem a origem de um termo grego antigo que era “châris” que seria o mesmo que “graça”. A caridade pode ter o entendimento como um sentimento ou uma ação altruísta de ajudar alguém sem buscar de qualquer recompensa. A pratica da caridade pode ser um indicativo muito forte de uma elevação moral e uma das práticas que mais se caracteriza a essência da bondade humana, sendo, com alguns casos, chamada de ajuda humanitária. Temos afins: amor ao próximo, bondade, indulgencia, perdão, compaixão. (Tirado do Wikipédia as informações).

Vamos ao que interessa. Feita a explicação de caridade já fica bem mais fácil explicar qual a diferença de caridade e ter boa vontade, que sim, faz a diferença. Na Idade Média – tem vários filmes sobre – existiam as caridades dos nobres na porta das igrejas e haviam milhares de deficientes se arrastando nas suas escadarias. Eram crianças abandonadas que eram alimentadas e criadas ou por moradores de rua (que seriam as cidades em volta do castelo do rei), ou pela própria igreja a pedir esmolas na porta das missas. Ai que está, caridade também tem o significado de ESMOLA. Esmola é uma pequena quantia de dinheiro dada a um pedinte por caridade. Em várias religiões, é considerado como um ato caridoso feito aos necessitados, pode significar também uma concessão a uma graça ou favor. Nas religiões abraâmicas, as esmolas são dadas para beneficia os pobres. No budismo, as esmolas são dadas por leigos para monges e freiras para conseguir méritos e bênçãos e assegurar a continuidade monástica. (Informações tiradas da Wikipédia)

Com certeza a questão é confusa porque nem sempre as pessoas têm noção de alguns significados do termo e além disso, a questão pode ser agravada com a mídia. Eu como sou uma pessoa que acredito no ser humano, acredito que a intenção da Laurinha Victória, não foi ruim (acho eu, né?), só acho, que a gravação do vídeo foi desnecessária. Porque acho que esse tipo de vídeo alimenta uma visão, que ainda, é muito forte dentro da nossa cultura de nos ver como coitadinhos, numa visão, clara, de capacitismo. Mas, quem realmente alimenta essa visão capacitista dentro da ótica social? A mídia. Qual é o intuito de um site de notícia, como o Extra, de usar a postagem de uma mulher que gravou um funcionário ajudando uma pessoa com deficiência? Daí eu remeto a um outro questionamento, não menos importante: por que a mídia não mostra outras situações que não são de imagens piegas? Por que as pessoas não se interessam?

A questão é mais ou menos assim, você escreve tragédia (eu escrevo e eu sei), é um reboliço tremendo, como se aquilo seja de uma importância máxima. Quando você escreve coisas positivas e sem nenhuma tragédia, as pessoas começam a ignorar. Até mesmo a minha manchete chamada “Funcionário dá comida ahomem com deficiência e gera polêmica”, foi ignorada como uma manchete menor. Ou porque não tem um nome fofinho, ou não tem um nome trágico. Sim. Deve ter um nome fofinho ou trágico e não para por aí, a questão vai muito além, deve ter vídeo motivadores. Somos vistos além de coitados, além de temos limitações, somos exemplos de superação. Devemos mostrar força, garra, vontade e que somos a real conjuntura de um ser humano que venceu as dificuldades da vida. Eu não compartilho vídeos piegas, vídeos de pessoas se machucando, e sim, vídeos educativos ou pesquiso sobre o fato. A imagem que fazem de nós, chega a ser patética e desumana.

O mais trágico é que essas mesmas pessoas – não todas elas, claro – param nas vagas do estacionamento reservadas, não respeitam filas preferenciais e nem acentos para pessoas com deficiência. E muito além disso, não respeitam nossa privacidade. Eu acho um “porre” ter vídeos mostrando coisas que todo mundo faz, e vem com esse ar piegas. Não acho valido e condeno esse tipo de coisa.

Amauri Nolasco Sanches Junior – formado em filosofia pelo FGV e também publicitário e técnico de informática e escritor freelance no jornal Blasting News

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